Luis Felipe Pondé escreveu hoje mais um artigo, como sempre
um excelente texto filosófico, vou coloca-lo a seguir e depois fazer
comentários sobre o assunto.
Luis Felipe Pondé
'Esperança do Mundo'
"Nunca confiei na
felicidade", diz o personagem de Robert Duvall no filme "Tender
Mercies" ("A Força do Carinho", título brasileiro bem infeliz
para o filme), papel com o qual ganhou o Oscar de melhor ator em 1983.
O filme narra a
derrocada de um cantor de música country e sua sofrida redenção, graças ao amor
e generosidade de uma mulher.
No filme, salta aos
olhos o deserto do Texas, a solidão de todas as planícies e a total ausência de
qualquer metafísica barata, coisa comum hoje no cinema, seja ela moral,
psicológica, ambiental ou política.
O homem e a mulher são
seres abandonados no mundo e devem cuidar de suas vidas porque ninguém mais o
fará.
Aliás, por falar em
metafísica, a pior é a política.
Mas da política trato
apenas por obrigação profissional, porque, como diz Albert Camus nos seus
"Cadernos" (o primeiro tem como título "Esperança do
Mundo"), ouvindo aqueles que se dedicam à política, podemos apenas
concluir que as pessoas se importam pouco com esta parte das suas vidas, uma
vez que todos na política mentem.
Acrescentaria, além dos políticos profissionais, os intelectuais que a
ela se voltam como redenção do mundo e forma de obrigar os outros a viverem de
acordo com os delírios que alimentam em seus gabinetes.
Enfim, no fundo, a
política pouco me interessa.
Trato-a assim como
quem deve cuidar de uma ferida —do contrário ela se infectará.
Noutro filme,
"Alabama Monroe" (2012), do diretor Felix van Groeningen, a
personagem feminina Elise, interpretada por Veerle Baetens, diz algo semelhante
ao final: "Sempre soube que tudo aquilo não podia durar, porque a
felicidade sempre acaba".
Referia-se ela ao amor
por seu marido Didier e pela pequena filha morta.
Sinto-me em casa
quando ouço pessoas dizerem coisas assim.
Pois se existem apenas
"três ou quatro atitudes diante do mundo", como dizia em seu
"Breviário da Decomposição" Emil Cioran, filósofo romeno
indispensável para quem suspeita que os trágicos gregos são quem tem razão na
filosofia, esta é a minha.
E seguramente a dele.
E também a de Camus.
Na mesma obra, Cioran
faz um diagnóstico preciso: "A obsessão pelos remédios marca o fim de uma
civilização, e, pela salvação, o fim da filosofia".
Por isso ele afirma
que desistiu da filosofia quando viu que em Kant não havia nenhuma tristeza.
Os filósofos, diz
Cioran, quase todos acabam bem, prova máxima contra a honestidade deles.
Sempre sinto um cheiro
de mesquinharia quando ouço alguém falar de uma nova dieta.
A vida, talvez seja
esta sua maior tragédia, se apequena quando não é de algum modo dada em
sacrifício.
Talvez seja isso que o
cristianismo queira dizer quando afirma que só quando se perde a vida se ganha
a vida.
E não há saída: somos a civilização da mesquinharia.
Até Cristo deve ser
saudável.
Sei que Camus considerava
o suicídio o único problema filosófico ("O Mito de Sísifo").
E sei também que ele
considerava um milagre um momento em que não tivesse que falar de si mesmo
(caderno "Esperança do Mundo").
Detalhe: Camus usa
expressões como "milagre", conhecia bem teólogos como Blaise Pascal e
conceitos como o de "graça", citando-os com precisão.
Mas eu suspeito que um
dos maiores problemas da filosofia, e certamente um dos maiores milagres na
vida, para quem tem um temperamento que desconfia da felicidade (trágico), é
justamente o problema que Camus diz "ser um bom título": a esperança
do mundo.
Como ter esperança no mundo sem ter que abdicar da capacidade de vê-lo tal
como é?
Por isso, sinto um
halo de graça quando vejo a esperança visitar o mundo.
Afora as ilusões, só a generosidade é capaz de acolher a
esperança.
Talvez o próprio Camus
dê uma pista neste "Caderno", sendo ele um filósofo, e sabendo, como
nós todos, que nós filósofos sofremos da vaidade intelectual como pecado
capital.
Camus diz que "a obsessão
em ter razão é a marca suprema de uma inteligência grosseira".
Portanto, talvez, a
humildade, virtude capital para Camus, seja a esperança para a filosofia.
Ou, como dizia Santo
Agostinho, o que falta ao filósofo é chorar.
Comentário:
Pondé nesse artigo mistura três temas, felicidade, filosofia
e esperança, portanto, temos vários aspectos a considerar.
O problema da filosofia é que ela é feita por intelectuais,
e estes, a maior parte deles, são seres alienados dominados pela ilusão de
"mudar o mundo", como Pondé mencionou: "os intelectuais que a ela se voltam (a política) como redenção do mundo
e forma de obrigar os outros a viverem de acordo com os delírios que alimentam
em seus gabinetes." e " nós
filósofos sofremos da vaidade intelectual como pecado capital.",
exatamente, é isso que acontece.
Em vista disso a filosofia vive do trabalho de alguns poucos
que não estão submetidos a essa desgraça.
A felicidade existe, é possível saborea-la, mas, a felicidade
é como uma brisa suave que vem a vai em pouco tempo, seria um enorme egoísmo
querer ser feliz todo o tempo!
Da mesma forma que é um enorme egoísmo querer viver
eternamente ao lado de deus, a suprema felicidade.
A esperança é uma ilusão, mais ainda se formos ter esperança
no mundo!
Ter esperança significa focar a vida no futuro e não no
presente que se desenrola ao nosso redor, é quase uma fuga, não se deve ter
esperança, isso não quer dizer que não iremos fazer planos para o futuro, mas
planos para o futuro são muito diferentes de esperança.
Dito isso em caráter geral, vou fazer algumas observações
mais específicas sobre o texto de Pondé.
Nietzsche descobriu que existiu um divisor de águas na
filosofia, esse divisor foram Socrates e seu discípulo Platão, antes deles a
filosofia grega tinha como fundamento a tragédia que representava exatamente as
condições da natureza e da vida no planeta, que desde a pré-história sempre foi
cruel para todos os seres vivos e em especial mais cruel ainda com o ser humano
com a aquisição da razão.
Depois de Socrates e Platão a filosofia teve como base a
ilusão, o "mundo das ideias" de Platão, que tal qual o paraíso os
humanos não fazem a menor ideia de onde esteja e se porventura existe, pois não
passa de uma suposição, de uma ilusão.
Tragédia grega - a realidade da vida humana
Essa concepção ilusória levou a filosofia a desembocar na
ideologia, Rousseau ao dizer que "o
ser humano nasce bom e que é a sociedade que o corrompe" deu início a
ideologia que almeja destruir a sociedade e fundar um "mundo melhor"
que nem mesmo sabe como seria.
A ideologia, que surgiu da filosofia ilusória, nada mais é
que uma revolta contra a realidade do mundo por ela (a ideologia) incorporada
na sociedade.
A ideologia nada mais é que ressentimento e ódio contra a
vida da forma que ela é, cruel, seres semelhantes a estes que se deixam dominar
por esse ódio, no passado (e ainda no presente), tentaram com a religião
aplacar sua revolta, mas, por mais que rezassem deus permanecia mudo sem dizer
uma palavra, devido a esse mutismo de deus, ao qual Karl Marx, que era cristão
fervoroso até 17 anos, sentiu e se revoltou, a saída foi a ideologia destruidora
- o socialismo, o marxismo, o comunismo, o anarquismo e a pregação da revolução
e da destruição da sociedade por eles julgada como "má".
Para desgraça da sociedade essa ideologia subversiva e
oculta, perseverante, nunca desiste da "luta" apesar dos inúmeros percalços e genocídios que causou, se infiltrou em todas as instituições da sociedade ocidental, na
educação, nas instituições políticas e econômicas, na ONU, no FMI,, na midia, nas redes sociais, nas ONGs, está por
toda parte e ameaça a humanidade de morte, e o pior, a humanidade alienada pela "educação" que recebeu não sabe
dessa ameaça.
Entretanto, a questão não é em sua essência filosófica, é
pessoal, Sartre descobriu dois princípios de suma importância:
1. Nos seres humanos aconteceu o surgimento da Angústia pela
aquisição da consciência da morte, que aterroriza os seres humanos.
2. "O inferno são os outros.", ou seja, a desgraça
toda não está em nós, está nos outros.
Livrarem-se destes dois enormes fardos é a chave para olhar
e participar da tragédia humana sem se afetar e conseguir paz interior e
dignidade, que são valores pessoais e não filosóficos.
Shakespeare já ensinou aos teólogos e filósofos: "Há mais entre o céu e a terra do que
pressupõe vossa vã filosofia"... mas, a vaidade pessoal dos
intelectuais é imensa e sempre renovada e eles jamais aprendem.
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Parabéns pelo perfeito comentário!
ResponderExcluirObrigado Kleber!
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